Maria
Antonia tem 79 anos, reside há seis anos em Florianópolis. Estudou durante 30
anos. O último ano de ensino formal foi 1995. Em 2015, ingressou no NETI.
O
livro preferido é A Menina que Roubava Livros (de Markus Zuzak). Sua música
preferida é Pra não dizer que não falei de flores. Antonia participou da XV
SEPEX/UFSC (2016) e assim avaliou: "A oficina de criação literária do NETI
mereceu destaque sob a coordenação da professora Edna Merola. O objetivo foi
mostrar ao público presente, de forma interativa, um recorte das oficinas de
poesia. O interessante foi que a comunidade presente participou ativamente dos
exercícios, junto aos alunos e à professora. Foi um trabalho muito rico que
divulgou de maneira muito positiva as atividades do NETI".
MULHER
Numa
noite plácida e divina
Dormia
a natureza em seu leito
E
o céu iluminado de estrelas
Inspirou
a criação de um ser perfeito.
O
alvorecer acordou a natureza.
Que
de um impulso a deixou de pé.
Lembrou-se
do seu sonho iluminado,
E
criou a figura da mulher.
Poderosa
criadora,
Cheia
de graça e beleza,
Pois
a mulher que criou,
Confunde-se
com a natureza.
Como
e capaz de existir
Perfeição além dos céus?
Como
disse Castro Alves:
Amar-te
é melhor do que ser Deus.
Beira
de Estrada
Viajando para o sul,
Já à noite e bem cansada,
Fui me hospedar num hotel
Ou pensão de beira estrada.
Havia um grande rol,
Na entrada da pensão,
A metade era coberta
E tinha uma televisão.
O recepcionista, sem senões,
Um rapazinho pacato,
Foi dando as informações
E nos levando pros quartos.
Lá fomos envolvidos
Com abraço acalorado
Lá não penetrava o sol
E o calor era dobrado.
Tinha um fedor de mofo
Ali ele fez a festa!
Pois o teto era encharcado
E pingava em nossa testa!
Eu estava com suporte
Eram oito pessoas agora.
Dois carros tiveram sorte,
Porque dormiram lá fora.
Essas coisas valem a pena
Quando não se tem dinheiro,
A gente sai bem cedinho
E nem olha pro porteiro.
Para minha netinha,
O grande prazer da vida,
É vivê-la intensamente
E com os nossos amores
Espalhar nossa semente.
Brotam flores tão singelas!
E quando a primavera avança,
Os frutos que amadurecem
Tem gosto de uma criança.
Vamos festejar este fim,
De ano bem turbulento!
E esperar que o próximo,
Traga menos desalento.
Desejo a todos que haja uma grande mudança de atitude na mentalidade política do povo brasileiro.
Para Luciano
Amor
que mãe tem por filho
É
sentimento irrestrito.
Quanto
mais na vida cresce,
Mais
se torna infinito.
Dizem
que vem do sangue
Pode
ser verdade sim.
Tirando
o sangue do corpo
Será
que ele chega ao fim?
Acho
que mesmo assim,
Esse
fim nunca se dá.
Porque
sei que este amor,
Está
no DNA.
Para
Marcelo,
Nossa
maior sorte,
É
ter sorte de nascer.
Agora
depende de nossa
Ações
pra sobreviver.
Carregados
de coragem,
Fé,
pensamento e ação,
Só
que precisamos muito,
De
controle da emoção.
Nossa
cabeça pensante,
Tem
pensamentos fecundos
Nem
sempre o que é bom pra nós,
É
bom pra todo mundo.
Mas
nós somos carregados,
De
muita bondade escondida.
Elas
têm que vir na frente,
Das
ações em nossas vidas.
Nas
carruagens da vida,
Levamos
nossas bagagens.
Nos
lugares que chegamos,
Deixamos
nossas imagens.
Você
é uma pessoa muito querida.
Sorte
e coragem, em sua vida!
Florianópolis, 27 de outubro de 2016.
Nunca
andei sozinha no mundo. Cada ser que me encontrava se juntava a mim. Andei por
vales e rios, cachoeiras e cascatas, cavernas escuras, ou em cima d'água.
Animais peçonhentos, passei por cima. Caminhos tortuosos por onde andei sempre
teve uma chegada. Lugares distantes, bonitos ou feios. Via tudo com clareza, distinguia
as cores, texturas, leveza ou dureza. De tudo eu levava amostras. Nada foi
jogado fora. De tudo precisei para crescer na vida. Tive tudo o que queria,
porque só queria o que podia. Sonhava com as coisas mais simples. Mas nem
pensem que foi fácil. Foi tudo a base de sangue, suor e lágrimas. O que se pode
e o que se sonha não quer dizer que é fácil. Mede-se pela capacidade. O que
para mim era inatingível para outros era jogado fora. Sai de um lugar finito
para um infinito, onde as pessoas diante de mim sabiam tudo. Fechava os olhos e
andava só com força e coragem. Foram anos que andei assim. Quando me dei conta,
já havia feito tudo o que a vida pediu.
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Criação de Maria Antonia e outros |
Florianópolis, 1 de setembro de 2016.
O que ouvi da minha mãe quando nasci
Dorme, você nasceu.
Seu nome é nome de santo.
Eu escolhi esse nome
Pra brilhar o seu encanto.
Antonia
Andando
sempre se chega,
Nasce-se pra se viver, em
Todas
as etapas da vida,
Ondas
vão aparecer.
Nunca despreze nada,
Ilhada
ou constrangida,
Ame
o que conseguir na vida.
Florianópolis, 21 de agosto de 2016.
DESCONCENTRAÇÃO
Por
um momento apenas
Roubada
a sua atenção
Estava
na sua antena,
Uma
grande previsão.
Ia
ser grande a conquista
Nesse
imenso pavilhão.
Já
próximo da finalista,
E
por um desvio de atenção,
Que
tristeza infinita
E
por um piscar de olhos,
Foi
se embora o medalhão!
Só
por desvio de atenção...
Florianópolis, 14 de junho de 2016.
Texto para Teatro de Objetos com Coro.
Quem não se comunica se trombica!
Gatinho preto por que você está sentado em cima desta história?
Estou sentado dentro de um calhambeque, me protegendo do escuro.
O calhambeque mais que depressa abriu a porta e o Pintalgato caiu na noite escura. Ele não sabia que o gatinho preto estava se aproveitando dele para desobedecer a uma ordem de sua mãe. Não perguntou! Quem não se comunica se trombica!
Florianópolis, 12 de junho de 2016.
Festa de São João
Uma família muito divertida se reuniu para fazer uma festa de São João. A ideia foi do Senhor Milho Verde, que convidou seu irmão Amendoim para participar do evento. Falou com Sr. Madeira para preparar uma fogueira. D. Pólvora fez os fogos: traque foguete bomba, busca-pé.
O salão da festa era o Arraial.
A mulher do Sr Milho verde, d. Pamonha ficou responsável pela comida e bebida da festa. Também fizeram parte da equipe o irmão de D. Pamonha, Bolo de Milho e seu filho Lele.
Canjica a filha mais velha do casal ficou responsável pela coordenação da festa. Laranja, tangerina, limão, farinha de tapioca vieram de outras localidades próximas para abrilhantarem a festa.
Bebidas especiais são servidas nas festas de São João. E ninguém melhor do que Senhor Jenipapo, dona Pitanga, a garota Laranja, a sapeca gengibre e a colorida Tangerina para preparar os deliciosos licores, tão apreciados nesses festejos.
A festa ainda não estava completa. Faltavam seus animadores e consumidores.
Ainda na roça viram um ser estranho que se aproximavam das plantações e parecia conversar com cada uma delas, amavelmente. E foi assim que tiveram a ideia de convidá-lo para a festa. Bastou chamar um para encher o arraial. Não faltou sanfona, pandeiro, zabumba e triângulo. A festa durou enquanto estávamos vivos.
Daí não soubemos como foi o final dela. Alguns dias depois, quem ficou na roça ouviu comentários que a festa só acabou quando não havia mais o que comer, nem beber. E que todos saíram desfigurados.
Florianópolis, 15 de maio de 2016.
Ao meu querido neto Gabriel,
Apesar de vivermos distantes, as notícias sobre você me chegam constantemente.
O pai de sua namorada foi para os EE. UU.,para trabalhar por falta de opção aqui no Brasil.
Vai também levar a família. São três filhos e a esposa, todos em situação irregular naquele país.
Sua namorada tem 17 anos e é totalmente dependente dos pais. Soube que ela pretende ficar, alugar um apartamento, morar com uma amiga e dividir o aluguel. Como ela é muito dependente, parece que os pais não vão aceitar essa proposta. Portanto ela deve ir. Imagino como sua cabeça está a mil por hora! Está pensando também em ir com ela não é?
Você igualmente à sua namorada é totalmente dependente de seus pais. Estuda numa universidade particular e não tem renda alguma, apesar de já estar com 19 anos.
Não acha que deve pensar numa nova forma de organizar sua vida para tomar uma decisão mais acertada?
As precipitações impensadas quase sempre são desastrosas. Não desejo isto para o meu neto.
Pense muito e me responda. Quero lhe ver feliz porque te amo.
Abraço, Maria Antonia.
Salvador, 18 de maio de 2016.
Minha querida vovó Toinha,
Recebi sua carta e fiquei surpreso pela rapidez com que você é informada sobre a minha vida. Gosto até de você saber tudo sobre mim, porque seus conselhos me levam a pensar.
Só me admiro com a eficiência dos informantes. Seus palpites são importantes para serem avaliados por mim. Mas desta vez vou enfrentar os meus impulsos, já que meu pai não me mega apoio, mesmo desejando que eu pense o contrário.
Eu quero ir com minha namorada para os EEUU. Vou enfrentar os desafios e tentar trabalhar e estudar. Acho que meu pai vai me ajudar com um pouco de grana para os estudos. O resto vou me manter trabalhando.
Por enquanto essa é a maneira que estou pensando para me organizar nessa tomada de decisão. Agradeço seu interesse pela minha felicidade.
Um grande abraço do seu neto, Gabriel.
Florianópolis, 12 de maio de 2016.
Quanta gente existe por aí que fala tanto e não diz nada
Ou quase nada.
Já me utilizei de toda a escala e no final não sobrou nada
Não deu em nada.
Caminhando contra o vento
Sem lenço sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou.
Com tanta gente que partiu
Num rabo de foguete
Chora!
A nossa pátria, Mãe gentil
Choram Marias e Clarices
No solo do Brasil!
Florianópolis, 07 de maio de 2016.
1962, 1967, 1979
1962.
Que país é esse nosso,
que vive feliz assim,
misturando futebol,
com política tão ruim?
Mas gosta também de música Beatles,
Bossa Nova, tudo em fim.
Existe tempo ruim,
para um Brasil assim?
Em 1967:
Meu país estava triste,
a revolta foi geral.
Em vez de presidente,
quem governa é marechal.
Com o tal do marechal,
a coisa ficou bem feia.
O cidadão que reclama,
É levado pra cadeia
Ninguém podia falar.
Nem escrever, nem cantar.
Tudo era censurado...
Oh! Terrível militar!
1979:
Ninguém aguentava mais
tanto tempo de angústia.
Foi aí que Figueiredo,
decretou a anistia.
Acho que teve medo
da revolta popular.
Mesmo ameaçando o povo
resolveu anistiar.
Falou que quem fosse contra
àquele tipo de anistia,
prendia e arrebentava,
sem nenhuma cortesia
(Sofri muito nesse tempo).
Florianópolis, 22 de abril de 2016.
As recordações evocadas pelos anos em que começou a trabalhar informalmente e pelo ano em que teve o seu primeiro emprego formal levaram Maria Antonia a escrever sobre a moeda brasileira, sem se lembrar qual era o seu nome. Ao pesquisar, constata-se que em 1959 e em 1963 era o cruzeiro. O esquecimento dela é natural, já que conheceu várias moedas no decorrer de sua vida: cruzeiro, cruzeiro novo, cruzado, cruzado novo, cruzeiro real, real...
Leia sobre o dinheiro que circulou no Brasil de 1959 até hoje, pelo link:
Irá perceber que a história narrada por Maria Antonia é bem interessante!
Fatos marcantes da minha vida...
Um dia em 1959, ainda como estudante do curso pedagógico, fui convidada para dar aula de religião, numa escola de uma amiga. O salário oferecido foi de $0,50 ( cinquenta centavos por mês, uma aula por semana). Que coisa boa! Naquela época, consegui comprar um guarda-roupa, um ferro elétrico e ainda sobrou um trocado para o transporte do primeiro mês. Esse emprego rolou por mais ou menos um ano. Perdi o emprego quando entrei na faculdade (por falta de tempo).
Comecei um emprego formal em 1963, antes de terminar meus estudos. Sai da capital,fui para o interior. Lá eu recebia quase $ 2.000,00. Sabe qual foi a diferença sentida em relação ao outro salário?
No primeiro salário de $0,50 não pagava aluguel, tinha onde comer, vivia de farda. No outro, tinha que comprar comida, pagar aluguel, comprar roupa e muitas coisas mais.
Ano em que me apaixonei... A adolescência é um caso sério. Apaixona-se a cada instante e por qualquer motivo. Não é fácil lembrar em que ano se deu a primeira paixão. É mais fácil lembrar-se da paixão mais forte e marcante da vida. Casei com a primeira forte, em 1966. Como não se deve casar com paixão ela acabou cinco anos depois, mas só fui me livrar dela oito anos depois. Continuei, mesmo depois de casada, a me apaixonar e alimentar meu ego por atitudes românticas.
Em 1968, tive meu primeiro filho, época tumultuada em que eu não estava bem nem com minha paixão (marido), nem com o meu país. Foi difícil, mas se criou...
Ano em que fiz algo considerado útil... Vim da Bahia para Florianópolis em 2009, por opção própria.Tenham certeza de que não foi fácil essa tomada de atitude. Com a idade avançada, 72 anos (na época) abandonando toda uma vivência em território distante e com características diferentes (climas, costumes, pessoas, etc.), pensei em ficar num lugar mais seguro, perto de um filho, acompanhada do meu espírito aventureiro,vendi o que tinha,preparei a mudança e aqui estou feliz da vida!