terça-feira, 25 de agosto de 2020

Lendo Cinema XIII. Crimes de Família.

CRIMES DE FAMÍLIA- DIR:SEBASTIÁN SCHIVEL- ARGENTINA-2020

Um homem acusado de agredir e estuprar a ex-mulher e a mãe dele lutando desesperadamente para provar sua inocência. Esse resumo pode remeter a muitos outros filmes, mas não se engane, há mais coisas pela frente. Na verdade, não se vê apenas um, mas dois julgamentos em paralelo na tela. A diferença entre os dois é a classe social dos réus. O primeiro é o de Daniel, filho de uma família classe média alta e o segundo, de Gladys, empregada dessa mesma família. Ao final, a história nos apresenta um enorme dilema.
A atriz que interpreta Alícia, a mãe que abre mão de tudo para defender o filho, é Cecília Roth, intérprete excepcional de “Tudo sobre minha mãe”, de Pedro Almodóvar.


“Crimes de família” (Crimenes de familia) tem algumas falhas de roteiro, mas se redime no desfecho do filme.

Abertura por Brígida de Poli


Ficção & Realidade. Marlene Xavier Nobre

O filme retrata o inferno que um viciado em drogas é capaz de fazer: perder a razão e a lucidez.
Naquele lar tudo se transformou em pesadelo para um casal abastado, a partir das prisões de seu filho único Daniel, viciado em drogas e que comete delitos, deixando toda a família desestruturada e doentia.
A trama mostra os fatos: a separação de Daniel da mulher e do filho pequeno, a gravidez da empregada, e a separação dos pais do jovem adulto viciado.
O que mais me chama a atenção é que Alicia abre mão do conforto e do seu casamento de anos pelo amor ao filho viciado.
Alicia, no final, não abandona a nora e nem os netos. Aproxima os meninos.
O que Alicia suportou por amor a seus netos faz da personagem um grande exemplo de mãe e avó.
Independente de classe social toda a família que vive esse drama em casa não tem um final feliz. A droga é uma lepra, quando adentra qualquer lar, tira todos os que ali residem da zona de conforto. A droga mata sonhos, destrói famílias, corrói vidas, separa amores. Quantas mães vivem isso na pele!



Comentários. Edna Domenica Merola

Gladys é a personagem que engravida de um estrupo, mas não sabe que o agressor pode ser acusado. É a vítima que se incrimina pela violência  sofrida. 
O número exato de Gladys que há no mundo não posso calcular com exatidão. Mas aquilatar não é muito complicado. Tome o total de mulheres do mundo ocidental e do oriente "moderno" ou ocidentalizado, subtraia o número de mulheres graduadas e pós graduadas e as líderes que encabeçam movimentos em prol de minorias.  Subtraia ainda (por benevolência ao sistema) as brancas com Ensino Médio ou modalidade correspondente em anos de estudo. Salve esse montante.  Depois some-o a 99,9% do número de mulheres do oriente médio.
Mas sei que sabe, cara leitora, que números não aplacam o choro abafado por quatro paredes. Sei que sabe que uma mãe vitimada só pode gerar vítimas herdeiras de um sofrimento que nem tiveram a chance de construir.

Crimes de família. Clara Pelaez Alvarez
Se no filme “O jantar” a hipocrisia era servida em pequenos pedaços num restaurante, neste a hipocrisia é servida em suculentos pedaços em processos jurídicos. Os dois filmes mostram a fedentina social. Levantam o tapete e eis: hipocrisia e crueldade.
Filme que causa náuseas desde o início. Não há redenção possível para os personagens, quer sejam as “pessoas de bem”, os advogados, juízes, policiais. Fiquei procurando no bolso algum tipo de perdão, mas nada encontrei.  São todos cúmplices do horror. A sala do tribunal, vazia, escura e fria com uma única culpada esperando os carrascos mostra bem o que criamos.
Gladys é resultado da nossa cumplicidade social. A inocente que se crê culpada e que carrega todos os sofrimentos do mundo, ao melhor estilo cristão, redimindo a sociedade. Os invisíveis que quando percebidos causam pavor social, pois jogam luz à hipocrisia de todos nós. Quantas Gladys existirão neste mundo? Haverá por aí alguma Dulcinéia que, montada num Rocinante, empunhe a lança de batalha contra os moinhos de pessoas? Talvez. Mas uma só não bastará.


Brígida de Poli é jornalista, cronista, cinéfila, colunista do Portal Makingof  http://portalmakingof.com.br/cine-e-series. Simpatizante e voluntária em prol dos direitos e do bem-estar de refugiados. Idealizadora e mediadora do Lendo Cinema, autora do livro As Mulheres de Minha Vida, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-mulheres-da-minha-vida/

Edna Domenica Merola é Mestra em Educação e Comunicação. Autora do livro As Marias de San Gennaro, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-marias-de-san-gennaro/.

Marlene Xavier Nobre é autora de  Lembranças e Esperanças de uma Mulher (Insular, 2020); A Meus Queridos Netos (Postmix, 2017).

Links para leitura de postagens anteriores de Lendo Cinema

Lendo cinema I – O Jantar (Oren Moverman, 2017)


Lendo cinema II – As Baleias de Agosto (Lindsey Anderson, 1987)


Lendo cinema III – Eu, Daniel Blake (Ken Loach, 2016)


Lendo cinema IV – O Cidadão Ilustre (Mariano Cohn, 2017)


Lendo cinema V – A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batatas (Mike Newell, 2017)

Lendo cinema VI – O Filme da Minha Vida (Selton Melo, 2017)


Lendo Cinema VII – Nossas Noites (Ritshe Batra, 2017)


Lendo Cinema VIII – O Filho da Noiva (Juan José Campanella, 2001)


Lendo Cinema IX – O Vazio do Domingo (Ramón Salazar, 2018)


Lendo Cinema X – Whisky (Juan Pablo Rebella, Pablo Stoll, 2004)


Lendo Cinema X I –  Aquarius (Kléber Mendonça, 2016)

Lendo Cinema X I I–  A Prima Sofia (Rebecca Zlotowski, 2019)


sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Lendo Cinema XII. Prima Sofia,


PRIMA SOFIA - direção: Rebecca Zlotowski-França-2019

A história de A Prima Sofia (Une fille facile) é contada a partir da perspectiva de Naïma (Mina Farid), uma adolescente que vive na charmosa cidade litorânea de Cannes, no sul da França. Ao comemorar 16 anos, ela decide tirar o verão para decidir o que vai fazer da vida. Em princípio, Naima planeja com seu melhor amigo, Dodo (Lakdhar Dridi), fazer um teste para se tornarem atores. No entanto, quando Sofia (Zahia Dehar), sua prima de 22 anos, chega de Paris para passar as férias, Naïma é seduzida pelo seu estilo de vida livre.  As duas jovens se tornam inseparáveis, passando os dias na praia e as noites em boates. Logo, começam a chamar a atenção de homens mais velhos. Assim, elas conhecem Andrés e Phillipe, que passeiam pela Riviera Francesa em seu iate de luxo.  Se para Sofia aquele é um mundo bem conhecido, para Naima é uma nova e surpreendente experiência.

A Prima Sofia ganhou o Prêmio SACD na Quinzena dos Realizadores, tradicional mostra paralela do Festival de Cannes, em 2019.

Abertura por Brígida de Poli


Uma imigrante bem comportada. Por Edna Domenica Merola 

Prima Sofia é um filme com uma fotografia linda, mostra paisagens marítimas e praianas deslumbrantes, mostra a classe alta bem humorada e feliz em seu iate ou sua mansão numa ilha paradisíaca. Mostra também a classe média trabalhadora em serviços gastronômicos e se dá bem, se souber servir corretamente e desaparecer, quando os patrões quiserem. 
O filme não tem cenas de violência ou droga, mas de sexo explícito.
Mostra duas duplas de homens mais velhos e moças jovens. Os homens têm atitudes opostas frente às decisões dos limites perante as relações consentidas. 
A protagonista (menina bem comportada) tem aparência e nome de imigrante; vive na França, e, aos 16 anos, tem que se esforçar para permanecer na mesma classe social de seus ascendentes.
O filme parece querer tampar o sol com a peneira da realidade vivida por adolescentes que devem decidir seu futuro precocemente e se inserir no esquema demandado pelo modelo econômico, e ainda sendo de família de imigrantes e pertencentes à classe média, num país rico. 
A narrativa não é apenas confortável para a classe dominante. A narrativa da menina comportada é tipo um chip implantado em alguém, quer dizer que a fala dela é cooptação com a classe alta. Penso que a pedagogia subjacente é a da meritocracia. O filme parece palanque de plataforma de um partido político de direita da Europa fascista. A mensagem passada é a de que um governo eurocêntrico dá conta de controlar fluxos imigratórios, oferta suficiente de vagas para o primeiro emprego e todo o sonho dourado das camadas abastadas dos países que se inclinam para a postura fascista. Confiram assistindo (quem sabe exagerei...). 

A prima Sofia por Clara Pelaez Alvarez

Este é um filme sobre escravidão. Mas, ao contrário do que parece ser, a escravidão é voluntária ainda que não notada. Algumas opções estão na mesa: a escravidão hormonal, a escravidão ao dinheiro ou a escravidão das “pessoas de bem” (aquelas que trabalham das oito às cinco).
Normalmente estamos o tempo todo nos comparando uns aos outros. Assim aprendemos desde crianças. O resultado de uma comparação raramente é neutro, geralmente alguém ganha, alguém perde. Se quem perde é quem está no ato da comparação, sempre resta depreciar o “ganhador”, julgá-lo ferozmente. Desconfio que essa é a explicação básica por trás das polícias sociais (aquelas pessoas que vigiam o tempo todo o que os outros fazem).
Existem "n" formas de viver a vida. Todas trazem sabores e dores. Pode-se querer algo com muita intensidade e batalhar muito para consegui-lo. Pode-se ir com o fluxo sem pensar muito. Algumas escolhas definem a vida, outras definem apenas o minuto seguinte. Muito difícil saber em que ponto da transição nos encontramos. E está tudo certo.
As meninas fazem suas opções e suas descobertas. Usam e são usadas. Amam e são amadas. E a vida continua inexoravelmente rumo ao amanhã. Qual o tamanho das coisas trinta anos depois que aconteceram?

Brígida de Poli é jornalista, cronista, cinéfila, colunista do Portal Making Of  http://portalmakingof.com.br/cine-e-series
Simpatizante e voluntária em prol dos direitos e do bem-estar de refugiados. Idealizadora e mediadora do Lendo Cinema, autora do livro As Mulheres de Minha Vida, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular

Clara Pelaez Alvarez  é pesquisadora de ciência das redes.

Edna Domenica Merola, pedagoga e psicóloga, mestre em Educação e Comunicação, participa de Lendo Cinema); de Textos Curtos da Biblioteca do CIC (com Gilberto Motta e Esni Soares); das aulas sobre música popular brasileira ministradas por Alberto Gonçalves. Autora do livro As Marias de San Gennaro, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-marias-de-san-gennaro


Links de outras postagens de Lendo Cinema:
Lendo cinema I – O Jantar (Oren Moverman, 2017)


Lendo cinema II – As Baleias de Agosto (Lindsey Anderson, 1987)


Lendo cinema III – Eu, Daniel Blake (Ken Loach, 2016)


Lendo cinema IV – O Cidadão Ilustre (Mariano Cohn, 2017)


Lendo cinema V – A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batatas (Mike Newell, 2017)

Lendo cinema VI – O Filme da Minha Vida (Selton Melo, 2017)


Lendo Cinema VII – Nossas Noites (Ritshe Batra, 2017)


Lendo Cinema VIII – O Filho da Noiva (Juan José Campanella, 2001)


Lendo Cinema IX – O Vazio do Domingo (Ramón Salazar, 2018)


Lendo Cinema X – Whisky (Juan Pablo Rebella, Pablo Stoll, 2004)


Lendo Cinema X I –  Aquarius (Kléber Mendonça, 2016)
https://netiativo.blogspot.com/2020/08/lendo-cinema-xi.html

sábado, 15 de agosto de 2020

Lendo Cinema XI. Aquarius.

AQUARIUS – direção: Kleber Mendonça Filho – 2016
O filme de Kleber Mendonça toca em vários temas contemporâneos, como a especulação imobiliária e preservação da memória. Sônia Braga interpreta a jornalista Clara, aposentada, viúva, mãe de três filhos adultos. Como última moradora do edifício Aquarius, em Recife, ela tenta impedir sua demolição por uma construtora que pretende construir um grande condomínio à beira mar. Vemos também Clara lidando com os conflitos típicos de uma mulher na maturidade, inclusive a mutilação provocada por um câncer de mama. Mas, ela é resistente e não abre mão de sua sexualidade, nem de lutar pelo que acredita.
O filme foi muito bem recebido no Festival de Cinema de Cannes. A equipe causou polêmica no Brasil ao se manifestar durante o festival francês contra o golpe que provocou o impeachment da presidente Dilma. Isso provocou um chamamento de boicote ao filme no Brasil. Mesmo assim, Aquarius fez uma boa bilheteria, até porque os "boicotadores" não costumam mesmo ir ao cinema ou ver filmes mais complexos.
Sônia Braga recebeu vários prêmios pelo papel de Clara e Aquarius foi o vencedor do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.



Abertura, escolha do filme e mediação por Brígida de Poli


Uma escuta, por Edna Domenica Merola

No filme, Aquarius é o nome do prédio no qual a última moradora se opõe à compra pleiteada por uma incorporadora. Aparentemente, a temática é existencial. No entanto, o olhar da protagonista Clara tece o ângulo privilegiado da recepção da narrativa das histórias de vida de mulheres que lutaram pela justiça social nos anos 1960 a 2014. Destaca, ainda, o ano de 1980: um marco temporal importante na queda econômica da classe média. Ressalta a definição de classe social a partir da ocupação do espaço urbano dos grandes centros, a exemplo, dos condomínios de alto padrão à beira mar, nessas cidades.
A narrativa é linear. O ritmo do filme nos faz conviver com Clara por meio da escuta de sua fala pausada que provoca reflexão e nos desacomoda dos nossos lugares sociais. 
Para os fãs de Sônia Braga, vale conferir mais esse excelente trabalho!


Sobre o filme Aquarius. Marlene Xavier Nobre

Cada cena que via, na minha mente, fazia uma viagem no tempo.
Vi na personagem da Clara o mito de Lilith. A mulher, mesmo tendo conseguido o seu espaço, ainda hoje paga um preço alto por isso.  Por ter passado por uma mastectomia e quando envelhece, pra muitos é como se fosse pecado sentir desejos.
Quando uma mulher se libera sexualmente é tachada de tudo, fica visada, é olhada como prostituta. O homem e o dinheiro ainda prevalecem nessa sociedade absurda e suja. O filme mostrou várias faces da sociedade. Nos dias atuais, muita coisa já mudou, mas falta ainda muito. Infelizmente, ainda existem muitas mulheres submissas, emocional e financeiramente. É preciso ainda muita conscientização. É necessário reivindicar todos os nossos direitos. Essa luta tem pela frente um grande chão, para percorrê-lo precisamos dar as mãos. Sinto e vejo que a mulher tem uma força sobrenatural. A mulher ama e enxerga qualquer alma que clama.
A personagem mostrou força e muita garra, provou que a mulher é forte, mesmo tendo todos os motivos para ser frágil. Provou que as mulheres decidirão pra onde vão, pois lugar de mulher é onde ela quiser.

Reflexões sobre Aquarius, por Clara Pelaez Alvarez

Ao longo da vida vamos nos apegando a coisas e lugares. À medida que envelhecemos parece que mais entranhados ficamos na matéria. Mas estamos condenados à mudança. Vivemos numa sociedade instável em busca estabilidade. A impermanência embora seja tudo que há causa sofrimento.
Engraçado ver que a família piamente contava os grandes feitos da tia aniversariante enquanto ela se lembrava das grandes transadas com o amante casado. No fim das contas danem-se os diplomas, troféus e comendas. Divertido mesmo são as loucuras de alcova, os combates de Vênus, como já dizia Virgílio.


No mais é briga de redes dominantes. De gente que é e que conhece gente poderosa. Ao melhor estilo brasileiro tudo se resolve debaixo do pano, no jeitinho. Era uma grande corporação, mas ela era uma cidadã ilustre. Dois peões adiante e uma dama na diagonal: cheque mate.

Brígida de Poli é jornalista, cronista, cinéfila, colunista do Portal Making Of  http://portalmakingof.com.br/cine-e-series . Simpatizante e voluntária em prol dos direitos e do bem-estar de refugiados. Idealizadora e mediadora do Lendo Cinema, autora do livro As Mulheres de Minha Vida, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-mulheres-da-minha-vida/
Clara Pelaez Alvarez  é pesquisadora da ciência das redes.
Edna Domenica Merola, pedagoga e psicóloga, mestre em Educação e Comunicação, participa de Lendo Cinema ); de Textos Curtos da Biblioteca do CIC (com Gilberto Motta e Esni Soares); das aulas sobre música popular brasileira ministradas por Alberto Gonçalves. Autora do livro As Marias de San Gennaro, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-marias-de-san-gennaro
Marlene Xavier Nobre é autora do livro Lembranças e Esperanças de uma mulher, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/lembrancas-e-esperancas-de-uma-mulher/


Links para leitura de postagens anteriores de Lendo Cinema



Lendo cinema I – O Jantar (Oren Moverman, 2017)

Lendo cinema II – As Baleias de Agosto (Lindsey Anderson, 1987)

Lendo cinema III – Eu, Daniel Blake (Ken Loach, 2016)

Lendo cinema IV – O Cidadão Ilustre (Mariano Cohn, 2017)

Lendo cinema V – A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batatas (Mike Newell, 2017)

Lendo cinema VI – O Filme da Minha Vida (Selton Melo, 2017)

Lendo Cinema VII – Nossas Noites (Ritshe Batra, 2017)

Lendo Cinema VIII – O Filho da Noiva (Juan José Campanella, 2001)

Lendo Cinema IX – O Vazio do Domingo (Ramón Salazar, 2018)

Lendo Cinema X – Whisky (Juan Pablo Rebella, Pablo Stoll, 2004)  

sábado, 8 de agosto de 2020

Lendo Cinema X. Whisky.

WHISKY – Direção: Juan Pablo RebellaPablo Stoll – 2004

"Whisky" fala sobre o dono de uma fábrica em Montevidéu que simula casamento com uma funcionária ao receber o irmão, que não vê há duas décadas, para celebração judaica no túmulo da mãe. "Whisky" é a palavra que um dos personagens do filme, um fotógrafo, pede para as pessoas dizerem, para que se apresentem sorrindo nas fotos.... Corresponde ao “Xis” ou “alface” que nós brasileiros usamos na hora do clic.
Curiosidades : Os organizadores do Festival de Valdivia, no Chile, convocaram programadores de nove eventos cinematográficos para eleger os 10 melhores filmes latino-americanos dos últimos 20 anos. A eleição foi feita em comemoração aos 20 anos do festival.
Em primeiro lugar ficou o filme uruguaio "Whisky" (2004) de Pablo Stoll e Juan Pablo Rebella, esse último morreu em 2006, aos 32 anos. Uma surpresa porque superou os mais aclamados argentinos.

Abertura, mediação - escolha do filme - por Brígida Poli




"Whisky" e a felicidade fake por Edna Domenica Merola

Em tempos de pós verdade, o que continua valendo é a imagem ( uma que vale mais do que mil palavras). Redes sociais noite e dia vendendo e comprando imagens. Famílias, igrejas e demais instituições, vinte e quatro horas por dia no comércio da imagem. 
No filme, Whisky,  o protagonista é o primogênito de uma família judia que foi o cuidador dos pais e da pequena fábrica de meias da família. Já o caçula seguiu sua vida, casou-se, teve filhos, usufrui do que amealhou com seus próprios negócios (ainda que no mesmo ramo dos pais). 
O protagonista não consegue se relacionar com as pessoas, nem com os bens materiais. Vive a morte parental de maneira a não usufruir da própria vida. Quando o irmão, após muitos anos ausente vai visitá-lo, inventa a vida que não conseguiu viver. 
Após assistir ao filme, lembrei-me de um chefe que tivemos como educadoras e que dizia ao tirarmos fotos: "façam cara de inteligentes". Quem foi supervisora escolar em certa megalópole, na década de noventa, sabe de qual secretário da educação estou falando. Era sua melhor piada (que Deus o tenha junto com ela!). Era a imagem de equipe capaz que ele intentava preservar ou a da equipe bem humorada? De qualquer maneira era a imagem, apenas ela!
Assim consumia o momento das fotos das quais nunca me preocupei em guardar alguma cópia comigo... 
No lugar da preocupação com a imagem que me afasta da experiência vivida, tento colocar a autenticidade que revela sentimentos. Começo pelo apreço/ repúdio. Não é lá uma panaceia, mas é um caminho que pode levar à  reflexão necessária para uma vida mais consciente e plena.


Reflexões de Clara Pelaez Alvarez sobre Whisky
Um filme sobre hábitos e mulheres invisíveis em uma sociedade de homens egocêntricos. Com diálogos poucos e parcos a personagem feminina é que imprime a ação no filme. Ela é a alma de tudo. Sem ela nenhum ele vive. Neste filme o masculino se expressa pela competição e o feminino pela cooperação. O masculino é tosco e manipulador. O feminino é genial e flexível. Apesar dos hábitos ela abraça o novo e vai vivendo o processo divertindo-se no caminho. Até que, por fim,  a libertação. Ela não estava mais lá em frente àquela porta cinza feio esperando pelo carcereiro cujo cérebro foi danificado por anos de vício em mediocridade. Ele permaneceu preso ao ritmo das meias novas, ela simplesmente sumiu de uma história pequena.

Brígida de Poli é jornalista, cronista, cinéfila, colunista do Portal Making Of  http://portalmakingof.com.br/cine-e-series. Simpatizante e voluntária em prol dos direitos e do bem-estar de refugiados. Idealizadora e mediadora do Lendo Cinema, autora do livro As Mulheres de Minha Vida, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-mulheres-da-minha-vida/

Clara Pelaez Alvarez é pesquisadora da ciência das redes.

Edna Domenica Merola, mestre em Educação e Comunicação. Autora do livro As Marias de San Gennaro, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-marias-de-san-gennaro/.

Links para leitura de postagens anteriores de Lendo Cinema

Lendo cinema I – O Jantar (Oren Moverman, 2017)

Lendo cinema II – As Baleias de Agosto (Lindsey Anderson, 1987)

Lendo cinema III – Eu, Daniel Blake (Ken Loach, 2016)

Lendo cinema IV – O Cidadão Ilustre (Mariano Cohn, 2017)

Lendo cinema V – A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batatas (Mike Newell, 2017)

Lendo cinema VI – O Filme da Minha Vida (Selton Melo, 2017)

Lendo Cinema VII – Nossas Noites (Ritshe Batra, 2017)

Lendo Cinema VIII – O Filho da Noiva (Juan José Campanella, 2001)

Lendo Cinema IX – O Vazio do Domingo (Ramón Salazar, 2018)