segunda-feira, 13 de julho de 2020

Lendo Cinema VI. O Filme de Minha Vida.

Abertura por Brígida de Poli

O FILME DA MINHA VIDA – direção: Selton Melo – 2017
 Adaptação do romance Um Pai de Cinema, escrito pelo chileno Antonio Skármeta, autor também do famoso O Carteiro e o Poeta. 
O filme se passa nos anos 60, na serra gaúcha, e gira em torno de Tony, filho de um francês e uma brasileira, que estuda na cidade para ser professor. Quando ele retorna para casa vê o pai, Nicolas, ir embora para a França, sem nenhuma explicação. Na ausência da figura paterna, Tony desenvolve uma profunda amizade com Paco, antigo amigo de seus pais. Ele e a mãe nunca superaram a tristeza pela ausência de Nicolas. Um dia, Tony tem uma grande surpresa. 
Direção: Selton Melo Elenco: Johnny Massaro, Selton Mello e Vincent Cassel 
Disponível: Netflix 


 Depoimento de Edna Domenica Merola

Mais um filme lindo escolhido por Brígida de Poli para um pequeno grupo do qual faço parte. Não se trata apenas de outra escolha apropriada e sim de algo muito especial. A poética do filme me tocou por meio do colorido outonal que impregna as imagens que o protagonista narrador relembra, em especial, quando se trata da mãe dele. Sensibilizaram-me, ainda, as imagens telúricas das caminhadas de Tony Terranova nas estradas de terra, quer seja de bicicleta (cenas da infância) ou moto (cenas da juventude). As cenas recorrentes da estação de trem jogam com luz e sombra: claridade trazida por quem chega e obscuridade deixada por quem vai. A estação de trem comparece como símbolo de limiar ou passagem. É por meio de uma viagem de trem que o jovem protagonista chega à fronteira, local onde inicia sua vida sexual e desvela o motivo do desaparecimento de seu pai. A primeira cena do condutor do trem inclui uma imagem de seu rosto cujas rugas lembram raízes. Tal personagem é telúrico e outonal: enrugado como a terra árida, consciente de sua importância para a mobilidade existencial e outonal por implicar na ideia de olhar para atrás e aquilatar, ação fundamental para inaugurar novos futuros. 

 A trilha sonora remonta aos “anos sessenta” (1960): rocks em inglês ou versões brasileiras, música francesa e nacional. Há três músicas de três cenas de determinados personagens que prenunciam fatos vindouros da narrativa. Essas músicas são associadas a reminiscências e "cor local": 
- Hier Encore, ponto alto do filme: verdadeira referência sonora da obra

 - Coração de Papel: ao som dessa música, as cenas mostram os jovens da cidade em torno da escola, com suas lambretas e óculos escuros e demais vestimentas copiadas dos filmes de Hollywood. 
- Habanera: música usada para ensaio de uma coreografia por alunas da escola na qual o protagonista é professor. Ele perde os pés do chão ao ver a beleza de duas irmãs. Mais tarde ele vai escolher a mais nova para ser sua namorada

 Reflexões sobre “O filme da minha vida”. Clara Pelaez Alvarez 
 Metade da vida é guiada por hormônios e a outra metade por regras sociais. E as duas metades raramente concordam... Entre essas trincheiras intransponíveis se entrelaçam afetos, amores, medos, lamentos, sonhos e ilusões. Quando nascemos nossos cérebros estão prontos para absorver qualquer realidade e ao longo do tempo são moldados pelas crenças e pressupostos das redes nas quais estamos enredados (família, amigos, etc). Resta sempre a pergunta fundamental: aquilo em que acreditamos é nossa marca individual ou é apenas uma marca de crença coletiva? À medida que as experiências se acumulam os eventos antigos ganham novos contornos e nuances. Os olhos de ontem são diferentes dos olhos de hoje. A memória de ontem é diferente da memória de hoje. Este filme tem o ritmo lento da memória de um velho que não teme a morte e uma trilha sonora belíssima.

Brígida de Poli é jornalista, cronista, cinéfila, colunista do Portal Making Of  http://portalmakingof.com.br/cine-e-series . Simpatizante e voluntária em prol dos direitos e do bem-estar de refugiados. Idealizadora e mediadora do Lendo Cinema, autora do livro As Mulheres de Minha Vida, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-mulheres-da-minha-vida/
Clara Pelaez Alvarez  é pesquisadora de ciência das redes.
Edna Domenica Merola, pedagoga e psicóloga, mestre em Educação e Comunicação, participa de Lendo Cinema ); de Textos Curtos da Biblioteca do CIC (com Gilberto Motta e Esni Soares); das aulas sobre música popular brasileira ministradas por Alberto Gonçalves. Autora do livro As Marias de San Gennaro, Coleção Palavra de Mulher, Editora Insular https://insular.com.br/produto/as-marias-de-san-gennaro/



Para visitar os anteriores, clique no link:

Lendo cinema V

Lendo cinema IV

Lendo cinema III

Lendo cinema II

Lendo cinema I



Um comentário:

  1. Edna e Clara,

    Que belas reflexões! Fiquei até com vontade de rever "O Filme da minha Vida", que tive a chance de assistir no cinema, tela grande. Me emocionei muito. Obrigada.

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