sexta-feira, 22 de abril de 2016

Cartas de Oficinas de Escrita Criativa 2016.1. Edna Domenica Merola



Porto Interrogativo, 3 de julho de 2015.
Cara professora,

É verdade que quem conta um conto aumenta um ponto? 

A Sonhadora.




Porto Informativo, 03 de julho de 2015.          
Cara Sonhadora,

Segundo Huizinga (2000), as funções da linguagem são as de “comunicar, ensinar e comandar”.
Reconhecer tais funções implica em pensar que a escrita é representação da realidade pelo viés da ‘voz’ do narrador, quer seja ele um historiador contemporâneo ou um cronista pretérito diretamente subordinado a um poderoso rei.
A representação da realidade é cristalizada pela escrita. No entanto, a escrita literária não se obriga a estabelecer contrato de fidelidade com a realidade compactuada.
Narrar é inventar (iludir), já que a narrativa ficcional “privilegia apenas um ou dois pontos de vista a partir dos quais a história pode ser contada e concentra-se no modo como os acontecimentos afetam esses pontos de vista.” (LODGE, 2011, p 36).
Para ilustrar, o impacto que o ponto de vista tem sobre a narrativa, exemplifica-se pelo “efeito Rashomon”.
O filme Rashomon, dirigido por Akira Kurosawa, apresenta o Japão do século XI. Durante uma forte tempestade, um lenhador, um sacerdote e um camponês encontram abrigo nas ruínas de Rashomon. O sacerdote conta detalhes de um julgamento que testemunhou: trata-se do estupro de Masako e do assassinato do samurai Takehiro, marido dela. O julgamento do bandido Tajomaru é mostrado em flashback. Há quatro testemunhos. Cada relato mostra um ponto de vista único e conflitante com os demais. A tese implícita no filme é a de que cada narrador apresenta sua verdade sobre a mesma história. A expressão: “efeito Rashomon” quer dizer que nunca há uma mesma história; se houver diferentes narradores, o que há é uma suposição de uma mesma história.


Abraço, da Professora.


Porto Interrogativo, 3 de julho de 2015.
Cara professora,

Qual é a qualidade de escrita esperada em suas oficinas? É necessário pesquisar para escrever? E quanto aos aspectos formais? 

A Aluna.

Florianópolis, 09 de maio de 2016.
Cara aluna,

Se você é do tipo que detém bom conhecimento de determinado assunto, poderá colocá-lo em sua narrativa. Imagine que seu leitor é inteligente, curioso e receptivo, mas não um intelectual.
Se você tem medo de errar, liberte-se dele. Conscientize-se do que pode alcançar.
Se estiver insegura quanto à adequação do que aprendeu no passado, talvez queira algumas dicas: 
Escreva períodos curtos e parágrafos com poucos períodos.
Os períodos e parágrafos pequenos devem ser iniciados com o sujeito da oração para ajudar na clareza e concisão da narrativa.
Para aprender a criar personagens, deve escrever sobre a vida humana e não sobre a própria vida. 
Para uma iniciante, escrever autobiografia é como querer aprender a correr, antes de engatinhar. O narrador em primeira pessoa é um personagem e deve ser 'inventado'. Una lembranças a dados estatísticos. Ex.: Na sua infância, os brinquedos de vinil eram raros e os eletrônicos inexistentes? Como isso acontece no presente? Narre algum fato interessante sobre brincadeiras.
‒ Prepare-se para tolerar abstrações e enfrentar dificuldades durante o processo de aprendizagem das técnicas de narração. 
A narrativa em terceira pessoa também não garante facilidades para a escrita, quando o narrador permanece na posição narcisista.
A autora iniciante deve construir um narrador que não fique "olhando só para o próprio umbigo" o que poderia deixar sua narrativa pobre.
 Mostre claramente qual é a perspectiva da narrativa: incorpore as lições de Kurosawa em Rashomon, parta da pluralidade social. 
O narrador é o bandido, o Samurai, a representante do gênero feminino? É o empresário do agronegócio, o investidor da bolsa de valores, a dona de casa que vai ao supermercado? É o desempregado?
Por exemplo, se inventar um narrador para contar o impeachment do presidente Collor, ele terá de optar por uma perspectiva de quem teve seu dinheiro bloqueado ou pela perspectiva de quem conseguiu se safar do bloqueio e se deu bem. Nesta perspectiva, safou-se porque estava próximo ao governo e foi avisado de que haveria o "pacote econômico" ou porque não detinha recursos financeiros acumulados? A partir do narrador pode-se inventar seu antagonista.
Quem adotar Machado de Assis por modelo revelará isso no primeiro parágrafo, como ele o fez no conto Missa do Galo. Ex.: “Nunca pude entender a conversação que tive com uma senhora, há muitos anos, contava eu dezessete, ela trinta." (ASSIS, M.).
A principal dica:
‒ Creia no seu potencial de leitura e de escrita.
                                                A Professora.


Florianópolis, 22 de abril de 2016.
Caras Alunas e Caros Alunos da Oficina de Escrita Criativa,

Desejo que estejam todos muito bem! Estamos, pouco a pouco, tecendo nossos laços de ensino-aprendizagem. Considero que os ingredientes principais desse trabalho artesanal são: a paz cordial, a tranquilidade nos contatos, a compreensão tolerante, a lucidez nas atitudes...
Ao encerrar a primeira unidade do plano de ensino da Oficina de Criação Literária parabenizo, com alegria, os que: assistiram às três aulas dadas; enviaram duas tarefas: a- narração de sua chegada a Florianópolis (quer por nascimento ou mudança); b- narração de um fato marcante, associando-o a uma música; publicaram no blog Netiativo e responderam a todas as perguntas do questionário dado.

Atenciosamente, a professora.


Florianópolis, 15 de maio de 2016.
Caros alunos da turma 2016.1,

Após as leituras referentes à Oficina de Criação Literária, desliguei o computador e fui ao teatro. Após assistir a peça O Avaro ‒ produção espanhola trazida para SC pelo Fita Floripa, tive um sono bem tranquilo e, ao acordar, havia um refrão novo cantando na minha cabeça que queria 'puxar' um texto.
Era a frase: "tomo da tua palavra e me deleito dela". Que inspiração "saia justa"! O correto seria dizer "tomo tua palavra e me deleito com ela". Mas refrão é algo que bate à nossa porta, que grita e chora até ser amado... Alguém queria tomar a palavra? Ouvi...

Blogblogblog!

Tomo da tua palavra: e centro o dia contigo
Tomo da tua palavra: curto circuito engraçado
Tomo da tua palavra: nesta rua daquela infância
Tomo da tua palavra saudosa filha de mãe Além
Tomo da tua palavra: bananas e cebolas
Tomo da tua palavra ponte caloura para a H. Luz
Tomo da tua palavra: desconfiança civil...
Tomo da tua palavra bêbada equilibrista
Tomo da tua palavra bule derramado
(Culpado? O cachorro de rabo preto da roça de Orleans)
Tomo da tua palavra: larva que passa como uma onda no mar
Tomo da tua palavra e Blogblogblog!
Tomo da tua palavra e me deleito dela.

Caros alunos da turma Oficina de Criação Literária  2016.1, estamos no momento do curso em que tomo da tua e da minha palavra e faço um leito com elas. Nesse rio, rio/rimos... Que lá vem mais alegria textual!


REFERÊNCIA

MEROLA. Cartas em Posfácio in Diálogos da Maturidade. Florianópolis: Postmix, 2016.

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